O perfil heterogêneo dos idosos e a diversidade de aspectos que envolvem o processo de envelhecimento dificultam a implantação de políticas públicas.
Autora: Maria Célia Passetti
Editora: Prof. Larissa Bezerra
O Brasil envelhece de forma rápida e intensa. De acordo com o Censo Demográfico 2022, a população de pessoas idosas residente no Brasil é de 32.113.490 pessoas, representando um acréscimo de 56,0% em relação àquela recenseada em 2010. Dessa população total, 17.887.737 (55,7%) eram mulheres e 14.225.753 (44,3%) eram homens.
Segundo o IBGE, a cada ano, 650 mil novos idosos são incorporados à população brasileira. A previsão para 2050 é que tenhamos mais de 30% de idosos, ou seja, em três décadas o país vai dobrar o número de pessoas idosas, uma marca que países de alta renda levaram mais de cem anos para alcançar.
Essa realidade, de um lado, representa uma grande conquista social obtida pelos avanços da medicina, pesquisas científicas, melhorias na qualidade de moradia e vida, nos sistemas de educação e informação, saúde e prevenção, políticas públicas e garantias legais. Por outro lado, representa também uma grande preocupação pois, em pouco tempo, o país precisa se preparar para atender, em todos os segmentos, os desafios que essa geração requer e merece. Um cenário que convida a se oportunizar melhores possibilidades para um envelhecimento saudável, ativo e inclusivo, capaz de combater o idadismo (preconceito etário contra os mais velhos) e promover a empatia em conexões intergeracionais.
O desafio de enfrentar o próprio processo de envelhecimento
Não só a população brasileira está envelhecendo, mas a proporção da população de 80 anos ou mais também está aumentando, alterando a composição etária dentro do próprio grupo. Significa dizer que a população idosa também está envelhecendo. Isso leva a uma heterogeneidade do segmento idoso brasileiro, havendo no grupo pessoas em pleno vigor físico e mental e outras em situações de maior vulnerabilidade.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o envelhecimento em quatro estágios: Meia-idade: 45 a 59 anos, Idoso(a): 60 a 74 anos, Anciano: 75 a 90 anos, Velhice extrema: 90 anos em diante. Essas pessoas configuram-se como o contrário de tudo que é valorizado no momento presente, como a juventude a qual se associa a ideia de produtividade, vigor, alegria, prazer, beleza, sucesso, saúde, potencial.
Para compreendermos melhor a forma como essa fase da vida vem sendo designada, e como os idosos a enfrentam, entrevistamos o professor Dr. Pedro Navarro, Doutor em Letras e Linguística pela UNESP e professor associado da UEM em Maringá-PR.
De acordo com o pesquisador, com o passar do tempo vão surgindo termos novos para se referir a essa fase da vida, como por exemplo o de “melhor idade”, criado na França para mudar a imagem dos idosos e dar prestígio aos aposentados.
Suas pesquisas recortam a realidade brasileira entre os anos de 2010 a 2019. Já na época ele se incomodava com essa expressão estabelecendo uma idade como a melhor, já que a velhice, como qualquer outra fase da vida, tem aspectos positivos e negativos. Ao ouvir depoimentos dos próprios sujeitos idosos ele foi percebendo que essa designação não era tão tranquila assim. “Alguns idosos podiam até falar melhor idade, mas na sequência eles diziam que não é uma melhor idade, que isso traz doença, que a melhor idade mesmo é quando eram mais jovens. Embora dissessem que estavam vivendo bem, reforçavam que a melhor idade era a fase mais jovem”, disse.
Navarro destacou que na própria mídia começaram a surgir discursos de resistência a essa designação, embora ele frise o fato de que haja muitos idosos vivendo mais e melhor na comparação, por exemplo, de idosos dos anos 50. Em um breve relato do histórico da velhice no Brasil, o leitor entenderá porque se dizia nos anos 40, que uma pessoa de 35 anos já era considerada velha. Segundo Navarro, hoje uma pessoa de 80 anos não vai aceitar a expressão “velho”, “a gente vai ter uma série de depoimentos desses sujeitos dizendo ‘não, eu me sinto muito bem, eu faço coisas que eu não fazia antes, a minha cabeça é cabeça de jovem, meu corpo é um corpo de jovem, porque eu tenho experiência’”.
O professor citou também um novo termo que vem sendo usado: “adultez” que, para ele, alargou um pouco essa faixa etária grande, que é a idade produtiva, a meia idade da OMS. São pessoas que não querem se reconhecer como da terceira idade, preferem ganhar uma segunda fase adulta. Ele integra nessa adultez aqueles que não querem ser vistos como velhos ou idosos, que ainda consideram que são bastante produtivos. Esses “novos velhos” alegam, segundo ele, que por não tomarem medicamentos que têm a ver com memória ou qualquer outro tipo de problema mais grave, não seriam idosos. Para ele é uma tentativa de não querer se identificar com o que seria a velhice tradicional, porque a imagem do indivíduo idoso ainda remete, à noção de improdutividade, cansaço, apatia, tristeza, impotência, doença ou saúde frágil, entre outras associações negativas, talvez até pela própria duração de sua existência menos afetada pelo consumo desnecessário.
Mas é importante lembrar que não se fica velho aos 60 anos. O processo de envelhecimento se dá por toda a vida, do nascimento à morte, por meio de escolhas e de circunstâncias e o que se busca é alcançar um envelhecimento saudável, definido pela OMS como o “processo de desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional que permite o bem-estar na idade avançada”.
Após o movimento dos anos 2010 da inclusão em uma faixa de melhor idade desse sujeito, há um outro movimento de se levantar contra o preconceito em relação à pessoa da terceira idade. Para Navarro, o etarismo ou idadismo é uma forma de se referir a discursos preconceituosos na questão da idade do tipo, ‘mas essa roupa é para uma pessoa da sua idade?’, ‘você não deveria fazer coisas que têm a ver com a sua idade?’ Segundo ele, essa adultez é um elemento importante no combate ao etarismo. Por ser também uma construção social, a velhice vem impregnada desse tipo de preconceito, o que só dificulta se pensar em políticas públicas específicas para esse grupo tão heterogêneo.
Os desafios da saúde pública nos cuidados com as pessoas idosas
A própria Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa reconhece como desafios a escassez de estruturas de suporte qualificado para idosos e seus familiares destinadas a promover intermediação segura entre a alta hospitalar e a ida para o domicílio; número insuficiente de serviços de cuidado domiciliar ao idoso frágil previsto no Estatuto do Idoso. Sendo a família, via de regra, a executora do cuidado ao idoso. Nesse sentido, a portaria 2528 de 19/10/2006 reconhece a necessidade de se estabelecer um suporte qualificado e constante aos responsáveis por esses cuidados, tendo a atenção básica por meio da Estratégia Saúde da Família um papel fundamental; a escassez de equipes multiprofissionais e interdisciplinares com conhecimento em envelhecimento e saúde da pessoa idosa; e a falta ou implementação insuficiente das Redes de Assistência à Saúde do Idoso.
Se até 2006 o sistema de saúde estava tradicionalmente organizado para atender à saúde materno-infantil, não considerando o envelhecimento como uma de suas prioridades, a criação dessa política destaca uma importante consequência do aumento do número de pessoas idosas em uma população. “Esses indivíduos provavelmente apresentarão um maior número de doenças e/ou condições crônicas que requerem mais serviços sociais e médicos e por mais tempo, consumindo boa parte dos recursos de internação hospitalar do SUS, sem falar na carência de profissionais qualificados para o cuidado ao idoso, em todos os níveis de atenção.”

Além do controle e prevenção de agravos de doenças crônicas não transmissíveis essa política nacional, que serve de base para os planos municipais de atendimento às pessoas idosas, inclui a interação entre a saúde física, a saúde mental, a independência financeira, a capacidade funcional e o suporte social como fundamentais para a qualidade de vida dos idosos.
O envelhecimento populacional desafia a habilidade de produzir políticas de saúde que respondam às necessidades das pessoas idosas. A proporção de usuários idosos de todos os serviços prestados tende a ser cada vez maior, quer pelo maior acesso às informações do referido grupo etário, quer pelo seu expressivo aumento relativo e absoluto na população brasileira. Além disso, os idosos diferem de acordo com a sua história de vida, com seu grau de independência funcional e com a demanda por serviços mais ou menos específicos.
Vale lembrar que os idosos são potenciais consumidores de Serviços de Saúde e de Assistência, porque apresentam uma grande carga de doenças crônicas e incapacitantes, quando comparado a outros grupos etários. Nesse sentido, os governos procuram responder às demandas das pessoas idosas mais frágeis dentre a população em maior risco de vulnerabilidade, ficando um vácuo grande entre os vulneráveis e os que têm condições próprias de cuidar da saúde.
Quando o idoso apresenta incapacidade funcional ele pode ficar dependente de outra pessoa para realizar atividades e isso geralmente culmina na necessidade de um cuidador. A prevalência da incapacidade aumenta com a idade, mas não é essa que prediz incapacidades, apesar de mulheres, minorias e pessoas de baixo poder socioeconômico serem particularmente vulneráveis, como os estudos para a elaboração da política nacional de saúde da pessoa idosa fundamentam.
É consensual, hoje, que envelhecer deve ser com saúde, de forma ativa, livre de qualquer tipo de dependência funcional, o que exige promoção da saúde em todas as idades. A realidade mostra que que muitos idosos brasileiros envelheceram e envelhecem apesar da falta de recursos e da falta de cuidados específicos de promoção e de prevenção em saúde. Entre esses estão os idosos que vivem abaixo da linha de pobreza, analfabetos, os sequelados de acidentes de trabalho, os amputados por arteriopatias, os hemiplégicos, os idosos com síndromes demenciais, e para eles , a política nacional admite que “também é preciso achar respostas e ter ações específicas”.
Envelhecer mantendo a capacidade funcional e a autonomia, é reconhecidamente a meta de toda ação de saúde. Segundo as diretrizes da ONU, a abordagem do envelhecimento ativo baseia-se no “reconhecimento dos direitos das pessoas idosas e nos princípios de independência, participação, dignidade, assistência e autorrealização.”
Para tanto, é importante entender que as pessoas idosas constituem um grupo heterogêneo. Também será necessário vencer preconceitos e discutir mitos arraigados em nossa cultura. Nesse sentido, a Política Nacional orienta que “os profissionais de saúde e a comunidade devem perceber que a prevenção e a promoção de saúde não é privilégio apenas dos jovens. A promoção não termina quando se faz 60 anos e as ações de prevenção devem ser incorporadas à atenção à saúde, em todas as idades” e sintetiza que “envelhecimento bem sucedido pode ser entendido a partir de seus três componentes: (a) menor probabilidade de doença; (b) alta capacidade funcional física e mental; e (c) engajamento social ativo com a vida.”
Nesse sentido, os discursos sobre o “envelhecimento ativo” (adotado pela OMS no final dos anos 90) enfatiza em seus objetivos a necessidade de aumentar os anos de vida saudável, reduzir disparidades na saúde entre diferentes grupos populacionais e assegurar o acesso a serviços preventivos de saúde. Além disso, prega o incentivo ao equilíbrio entre a responsabilidade pessoal –cuidado consigo mesmo e ambientes amistosos para a faixa etária e solidariedade entre gerações. Também os discursos sobre a “capacidade funcional” (onde a saúde é medida não mais pela presença de enfermidades, mas pela capacidade da pessoa continuar a exercer suas funções vitais), surgem como candidatos a novos paradigmas para tentar reverter a antiga associação entre velhice e doença.
Mas há sempre o perigo de se disseminar falsas crenças sobre a velhice como, por exemplo, a de que ela possa ser evitada ou de que os cuidados para se manter longevo dependam apenas de responsabilidade pessoal. Outro perigo é não perceber que a velhice vem se convertendo em um nicho de mercado cada vez mais explorado. Com a conquista da longevidade o idoso é elevado à condição de consumidor em potencial, é interpelado a se manter ativo.
Pedro Navarro e seu grupo de pesquisadores sobre a produção de subjetividades nas terceira e quarta idades identificaram nos discursos sobre os idosos quatro movimentos de enquadrar o corpo idoso às injunções do mundo capitalista: um corpo que não envelhece, um corpo que não se cansa, um corpo que é produtivo e um corpo que deseja.
Em relação a um corpo que não envelhece, “a gente vai ter todo um trabalho de monetização do corpo do sujeito, que é torná-lo uma mercadoria, atendendo as demandas do mercado”. Aqui, segundo ele, entra por exemplo o campo da estética. Havendo condições, o idoso vai fazer os procedimentos necessários – harmonização facial, por exemplo – “para que as marcas do tempo sejam minimizadas e que pareça, então, não ter a idade que têm”.
Navarro, apesar de reconhecer muitas limitações dos idosos para ter acesso à tecnologia, fez questão de destacar o surgimento de blogs voltados à terceira idade feito por idosos, para promover uma espécie de letramento digital que permita ao idoso se beneficiar da navegação nesse novo mundo para eles. “Então, esse idoso aprende a usar essa ferramenta da tecnologia, da informação e também a navegar por esses sites”, minimizando um pouco a solidão que se abate sobre a terceira e a quarta idade. Até celulares específicos para a terceira idade foram surgindo para facilitar o idoso a acessar o que ele precisa dos dispositivos daquele celular.
Para ele, a tecnologia joga o idoso numa outra temporalidade. Com isso ele conclui que entrar nesse mundo tecnológico é colocar esse corpo para produzir também, de alguma forma. O mesmo se dá no campo do trabalho. Vários programas e campanhas foram aparecendo incentivando a pessoa aposentada a voltar a trabalhar. A empresa teria um ganho com uma pessoa aposentada pela experiência dela e pelo contato intergeracional.
Em várias áreas está havendo uma mudança no paradigma em relação ao idoso. Por isso, hoje se fala em envelhecimento ativo em vários aspectos além do físico. Mas Navarro lembrou que isso já vinha se delineando há alguns anos atrás com matérias especiais na grande mídia para a terceira idade. “Lembro-me de um encarte da Revista Veja trazendo um idoso fazendo rapel, para mostrar que os “novos velhos” podiam fazer várias coisas, que tinham que ser ativos, não podiam se cansar”. Por isso, idosos que dispõem de condições financeiras ou são assistidos por alguma política pública, já há algum tempo, tendem a investir no fortalecimento de seus corpos. Hoje, as academias fazem, inclusive, sessões específicas para a terceira idade, porque existe um imperativo a que o idoso mantenha sua independência funcional por mais tempo. Essa demanda por um corpo em movimento, contribuiu para se diminuir as possibilidades de dependência, e claro, gera impactos na economia”.
O professor Pedro Navarro explicou que o corpo do idoso também está sendo demandado a atender seus desejos. Isso significa mostrar que esse idoso pode voltar a ter vida sexual. “A medicina tem o Viagra e outros medicamentos também que ajudam. Tratamento hormonal para as mulheres. De alguma forma, esse idoso pode frequentar lugares, ele pode dançar, ele pode fazer passeios. E isso tudo pode permitir que ele pode ter uma vida sexual”.
Questões de gênero, étnico-raciais e de classe social perpassam o processo de envelhecimento
O envelhecimento é um processo heterogêneo e vivenciado de modo distinto por homens e mulheres, sobretudo, diante dos papéis sociais atribuídos aos gêneros. Assim se fala em feminização do envelhecimento para dar conta do fato de que cinquenta e cinco por cento da população idosa são formados por mulheres. A proporção do contingente feminino é tanto mais expressiva quanto mais idoso for o segmento. Essa predominância feminina se dá em zonas urbanas. Nas rurais, predominam os homens, o que pode resultar em isolamento e abandono dessas pessoas.
De modo geral, as mulheres enfrentam as mais diversas dificuldades para terem um envelhecimento saudável. No aspecto físico, por exemplo, elas sofrem com doenças muscoesqueléticas com maior incidência de doenças como osteoporose e osteoartrite, que aumentam o risco de quedas. As mulheres são responsáveis pela maioria das tarefas domésticas, o que aumenta o risco de quedas em casa. No aspecto financeiro elas tendem a ter menos reservas do que os homens e menos chance de conseguirem trabalho remunerado na velhice.
Na sociedade elas são avaliadas por sua capacidade de manter a aparência jovem e atender às expectativas de cuidados com os outros., apesar de conviverem com doenças crônicas limitantes. A obsessão das mulheres no combate aos sinais do envelhecimento mostra bem a dimensão da desigualdade em relação aos homens que tendem a perceber as rugas em seus rostos e cabelos brancos como signos de um amadurecimento charmoso, ou seja, aos homens é permitido envelhecer e ter marcas deste processo na vida e no corpo, já as mulheres são inseridas em um contexto de discriminação e segundo a lógica contemporânea devem se submeter a procedimentos estéticos e evitar as marcas da própria velhice.
Considerando estes e outros aspectos, em um projeto financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão federal que atua na gestão, regulação, desenvolvimento e incentivo à pesquisa científica no Brasil, a professora Doutora Larissa Michele Lara, do Departamento de Educação Física da Universidade Estadual de Maringá (UEM) procura entender os desafios decoloniais que perpassam o cotidiano das relações sociais, a partir dos enfrentamentos, em relação a várias questões, oriundas de todo um processo histórico de nossa herança colonial de subserviência, de patriarcado, enfrentando principalmente os marcadores sociais de diferença. Ou seja, seu foco é procurar entender, principalmente, como é que mulheres idosas são atravessadas por questões de gênero, por questões étnico-raciais e também por questões de classe social.
A professora desenvolve um trabalho educativo com idosas tanto na Universidade Aberta da Terceira Idade da UEM (UNATI), quanto no Centro Esportivo Miosotes, em Maringá-PR.

Pensar um projeto nessa perspectiva decolonial é, segundo a pesquisadora, se colocar num outro lugar de protagonismo, porque mesmo depois de o Brasil deixar de ser uma colônia de Portugal, isso ainda não nos libertou de instituições, hábitos e práticas coloniais. Nesse sentido a ideia central de projeto é entender como essas mulheres vivem as suas experiências no cotidiano – porque a cultura física está relacionada à cultura historicamente produzida que vão sendo passadas ao longo do tempo, significadas, ressignificadas, e estão intimamente relacionadas a relações de poder social.
Nessas relações de poder, desde o acesso à cultura física ou o não acesso, tem a ver com hierarquias. “Por meio de práticas corporais esses temas acabam aparecendo e vêm à tona problemáticas de classe social, do quanto a mulher é oprimida ou não, do que dificulta o acesso a uma prática de atividade física, uma prática corporal, quais são os limites, o que elas encontram como barreiras e aí nesse percurso”, explica a professora.
Na frente acadêmica de trabalho com os idosos a contribuição das pesquisadoras se dá no sentido da escuta das vozes dessas idosas: quais são as dificuldades para continuar no projeto até que ponto o fato de ser mulher, de ter talvez determinadas atividades domésticas ou de cuidados de parentes enfermos ou netos lhes impõe uma sobrecarga que as impedem de participar, de fazer atividades físicas que elas tanto precisam”, reitera Larissa Lara. Com isso o objetivo é também entender o que caberia ao poder público, ou às políticas públicas, para facilitar o acesso dessas mulheres à atividade física, como por exemplo, na questão da distância, ter mais práticas em locais próximos às residências facilitaria esse acesso.
A equipe procura observar problemas e elas compartilham juntas na forma de um círculo de cultura física, inspirado na proposta do Círculo de Cultura de Paulo Freire para alfabetização de adultos. Para a construção de consciência crítica dessas idosas, as mediadoras deixam sempre os participantes como protagonistas do processo. Nesse sentido, o círculo não tem um começo e um fim. O que há é um processo de mediação, de motivação para que elas falem, que sejam também protagonistas em diversas atividades de criação (haikai, um poema japonês, danças, e toda uma diversidade de práticas corporais)
Como resultado, a pesquisadora espera levar consciência da importância de práticas coporais, da criação ou da liberdade por meio do movimento, a importância da consciência do processo de identificação como ser agente no mundo de transformação, independente de cor, de classe social e de gênero. “Independente de como essas mulheres se percebem e, sobretudo, uma abertura para a diferença, para o processo, para a diversidade, para a consciência acerca das várias formas de existir nesse mundo”, concluiu ela.
Moradia: um dos problemas mais sérios para pessoas idosas em situação de vulnerabilidade social
Um desafio importante na questão dos idosos é quanto ao local de moradia. Em geral, os idosos podem estar no ambiente familiar ou em instituições de longa permanência para idosos (ILPI). É consenso entre as mais variadas especialidades científicas que a permanência dos idosos em seus núcleos familiares e comunitários contribui para o seu bem-estar, no entanto, os dados referentes à população idosa institucionalizada no Brasil são falhos. Em 2002, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados publicou o relatório “V Caravana Nacional de Direitos Humanos: uma amostra da Realidade dos Abrigos e Asilos de Idosos no Brasil”. De acordo com o relatório, havia cerca de 19.000 idosos institucionalizados em todo o País, o que representa 0,14% do total de idosos brasileiros. É de se esperar que esse número seja bem maior levando-se em conta que muitas das instituições asilares não são cadastradas e que grande parte funciona na clandestinidade.
Dada a heterogeneidade do grupo de idosos em vários aspectos, suas demandas também o são acarretando desafios para as políticas públicas que respondam a essas diferentes necessidades dos idosos. A tendência é que a proporção de usuários idosos de todos os serviços prestados seja cada vez maior, quer pelo maior acesso às informações do referido grupo etário, quer pelo seu expressivo aumento relativo e absoluto na população brasileira.
A heterogeneidade do grupo de idosos, seja em termos etários, de local de moradia ou socioeconômicos, acarreta demandas diferenciadas, o que tem rebatimento na formulação de políticas públicas para o segmento.
Um programa bem interessante nessa área são os condomínios para a terceira idade. No Paraná, residenciais com infraestrutura para atender exclusivamente pessoas idosas estão sendo construídos em 14 cidades do Estado, entre elas Maringá, no norte do Estado.
Os condomínios horizontais fechados para a terceira idade tem 40 unidades cada e são feitos dentro do Programa Viver Mais Paraná para atender a população de baixa renda. Os primeiros empreendimentos coordenados pela Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar) serão realizados em Cascavel, Cornélio Procópio, Fazenda Rio Grande, Foz do Iguaçu, Guarapuava, Irati, Jaguariaíva, Londrina, Maringá, Palmas, Piraquara, Ponta Grossa, Prudentópolis e Telêmaco Borba. Os municípios ainda participam do projeto por meio da realização de acompanhamentos médicos e sociais periódicos aos idosos dentro dos próprios condomínios.
Pelos contratos firmados com os municípios, as prefeituras serão responsáveis pela manutenção dos condomínios. Caberá às administrações municipais, também, a prestação de serviços periódicos básicos de saúde e assistência social nos condomínios, em espaços reservados para esta finalidade.
Poderão participar da seleção das unidades pessoas idosas com renda de um a seis salários mínimos, e que não sejam proprietários de outros imóveis. Os escolhidos vão poder residir nas casas por tempo indeterminado, sozinhos ou em casais, com o pagamento de uma contrapartida mensal de 15% de um salário-mínimo, que equivale atualmente a R$ 149,70.
Cada condomínio contará com infraestrutura de saúde, assistência social e lazer para os futuros moradores. Por conta disso, esse é considerado o maior programa de habitação do País para a terceira idade, a iniciativa do Paraná beneficia pessoas com mais de 60 anos que não tenham casa própria, sendo a cessão do imóvel feito por meio de aluguel social. O Viver Mais Paraná deverá ser ampliado no ano que vem. Futuras contratações poderão ser feitas em localidades acima de 30 mil habitantes, com obras em áreas doadas pelas prefeituras ou adquiridas pela Cohapar.
Maringá já tinha um modelo de moradia para idosos. Trata-se do Condomínio do Cidade Nova, um projeto de iniciativa da Secretaria Municipal de Habitação que contempla a construção de residências para pessoas idosas em situação de vulnerabilidade. A manutenção do Projeto está sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Assistência Social, Políticas sobre Drogas e Pessoa Idosa – SAS.

Inaugurado em 2010, o condomínio atende todas as especificidades dos moradores, com rampas de acessibilidade, academia de terceira idade, pátio de convivência, e espaços destinados a horta com plantas medicinais. Começou com 40 apartamentos de 47 metros quadrados, todos adaptados para dar maior conforto e segurança aos moradores, mas com a alta demanda, foi se expandindo. Este ano, foi inaugurada uma nova ala com mais 34 apartamentos viabilizados pelo Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social. Iniciativas como essa tem consolidado Maringá como cidade amiga da pessoa idosa.
Os desafios para a educação da pessoa idosa: o papel das universidades abertas da terceira idade
Desde a década de 60 há uma preocupação mundial com relação à educação continuada e políticas inclusivas em relação à pessoa idosa. Essa ideia que nasce na França, país pioneiro nesse estudo e nessa preocupação de educação continuada e inclusiva para a pessoa idosa, não é gratuito, porque a França é um dos países que tem a maior taxa de envelhecimento do mundo ocidental.
Na década de 80, começa a implantação de Unatis no Brasil. Uma das primeiras é da Unicamp e depois a da UFSC emSanta Catarina, pioneiras nesse projeto de educação continuada para a pessoa idosa e de políticas inclusivas que depois foi se espalhando pelo país.
Na UEM, segundo a coordenadora geral, professora Dra. Terezinha de Oliveira, foi no anos de 2000 que se iniciou no Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UEM um movimento para acolhimento e inclusão da pessoa idosa. A partir de estudos e pesquisas de docentes da Educação e da Filosofia, inclusive com tradução de materiais publicados na França e por volta de 2004, 2005, é criada uma comissão para pensar a criação da Unati-UEM. Entre 2007 e 2009, uma comissão foi instaurada pela reitoria à época e os trâmites para a aprovação final do projeto foram caminhando.

Terezinha Bellanda Galuch, Coordenadora Pedagógica da Unati-UEM – Maringá-PR. Foto: Maria Célia Passetti
O projeto pedagógico da UNATI da UEM sempre teve um diferencial importante em relação a outras universidades abertas: ele não abre mão do tripé que caracteriza o papel de uma universidade – pesquisa, ensino e extensão. Há universidades que priorizam o ensino de formação de cuidadores, ligado à Unati, mas não é a formação da pessoa idosa, como é priorizado na UEM, que não se limita a cursos de extensão. Segundo ela, isso tende a ganhar mais força com a curricularização dos cursos de graduação.
Desde a sua implantação oficial em 2010, ela segue a política da ONU e da UNESCO. Recebendo a clientela a partir dos 60 anos, a Unati não exige critério de escolarização para matrícula, porque as disciplinas ofertadas não compõem a base curricular de nenhum curso em específico, mesmo tendo oferta dos mais variados cursos e departamentos da Universidade, portanto, elas não visam a formação profissional em nenhuma área específica.
São os próprios idosos que selecionam de um rol de disciplinas ofertadas, até três disciplinas para cursarem em um dado período, independentemente do nível de escolaridade, ou da classe social ou de renda, sendo, pois, aberta à comunidade. A clientela varia de professores e ex-professores da própria instituição até alunos e ex-alunos e da comunidade em geral que tenham interesse no conteúdo disponibilizado. A Unati tem seu próprio conselho pedagógico que aprova as propostas de disciplinas, em suas ementas, programas e bibliografia. Essas são de 34 ou 68 horas, completando 17 semanas, conforme o calendário acadêmico da Universidade. Além delas são oferecidos os cursos de extensão em diferentes áreas.
A professora Maria Terezinha Belanda, coordenadora pedagógica da Unati, afirmou que, hoje, os cursos de graduação que curricularizaram a extensão procuram a Unati para ofertar atividades vinculadas aos conteúdos, aos temas do curso, para fazer extensão para pessoas idosas. Então, tem aumentado bastante essa oferta por alunos dos diferentes cursos da graduação.
Segundo ela, a Unati tem mais de 500 alunos matriculados no segundo semestre de 2024 e mais de 900 matrículas em disciplinas teóricas e práticas. “Nós temos alunos que frequentam a Unati desde a sua criação. Todos os anos nós temos novos alunos e nós temos essas pessoas que continuam, que se matriculam em outras disciplinas”, conta.